Chegou o Comunavírus: o coronavírus nos faz despertar novamente para o pesadelo comunista

Ernesto
Araújo

Ministro
de Relações Exteriores do Brasil

Chegou
o Comunavírus.

É
o que mostra Slavoj Žižek, um dos principais teóricos marxistas da
atualidade, em seu livreto “Virus”, recém-publicado na Itália
(*). Žižek revela aquilo que os marxistas há trinta anos escondem:
o globalismo substitui o socialismo como estágio preparatório ao
comunismo. A pandemia do coronavírus representa, para ele, uma
imensa oportunidade de construir uma ordem mundial sem nações e sem
liberdade.
Cito
e comento, a seguir, alguns trechos do livreto de Žižek, essa
obra-prima de naïveté canalha, que entrega sem disfarce o jogo
comunista-globalista de apropriação da pandemia para subverter
completamente a democracia liberal e a economia de mercado,
escravizar o ser humano e transformá-lo em um autômato desprovido
de dimensão espiritual, facilmente controlável:

Tomara
que se propague um vírus ideológico diferente e muito mais
benéfico, e só temos a torcer para que ele nos infecte: um vírus
que faça imaginar uma sociedade alternativa, uma sociedade que vá
além do Estado-nação e se realize na forma da solidariedade global
e da cooperação.”
Uma
coisa é certa: novos muros e outras quarentenas não resolverão o
problema. O que funciona são a solidariedade e uma resposta
coordenada em escala global, uma nova forma daquilo que em outro
momento se chamava comunismo.”
Žižek
não esconde seu anseio e sua convicção de que um vírus “diferente
e mais benéfico” do que o coronavírus, o vírus ideológico,
contagiará o mundo e permitirá construir o comunismo de uma forma
inesperada. Não está sequer interessado naquilo que funciona ou não
funciona para combater o coronavírus, a quarentena ou o fechamento
de fronteiras, pois o objetivo não é debelar a doença, e sim
utilizá-la como escada para descer até o inferno, cujas portas
pareciam bloqueadas desde o colapso da União Soviética, mas que
finalmente se reabriu. Tudo em nome da “solidariedade”, claro, do
mesmo modo que no universo de
1984
de Orwell a opressão sistemática fica a cargo do “Ministério do
Amor”. Quem quiser defender suas liberdades básicas, quem quiser
continuar vivendo num Estado-Nação, estará faltando com o dever
básico de “solidariedade”.
Um
primeiro e vago modelo de uma tal coordenação na escala global é
representado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) (…) Serão
conferidos maiores poderes a outras organizações desse tipo.”
Não
escapa a Žižek, naturalmente, o valor que tem a OMS neste momento
para a causa da desnacionalização, um dos pressupostos do
comunismo. Transferir poderes nacionais à OMS, sob o pretexto
(jamais comprovado!) de que um organismo internacional centralizado é
mais eficiente para lidar com os problemas do que os países agindo
individualmente, é apenas o primeiro passo na construção da
solidariedade comunista planetária. Seguindo o mesmo modelo, o poder
deve ser transferido também para outras organizações, cada uma em
seu domínio. Žižek não o especifica, mas provavelmente tem em
mente uma política industrial global sendo ditada pela UNIDO, um
programa educacional global controlado pela UNESCO e assim por
diante.
Tudo
isto acaso não mostra com clareza a necessidade urgente de uma
reorganização da economia global que não esteja mais sujeita aos
mecanismos do mercado? E aqui não estamos falando do comunismo de
outrora, naturalmente, mas de algum tipo de organização global que
possa controlar e regular a economia, como também que possa limitar
a soberania dos Estados nacionais quando seja necessário.”
Sim,
não é o comunismo de outrora, que instalava ora num país, ora
noutro, um sistema de planejamento econômico central, sempre
fracassado em proporcionar bem-estar, sempre exitoso em controlar e
oprimir a sociedade. Trata-se agora de um planejamento central
mundial, que certamente traria o mesmo fracasso e o mesmo êxito
desse modelo quando aplicado no passado na escala nacional.
Muitos
comentaristas progressistas moderados e de esquerda revelaram como a
epidemia do coronavírus se presta a justificar e legitimar a
imposição de medidas de controle e disciplina das pessoas até aqui
inconcebíveis no quadro das sociedades democráticas ocidentais.”
Žižek
menciona entre esses comentaristas a Giorgio Agamben, filósofo de
esquerda aparentemente não-marxista, que escreveu com grande
apreensão sobre o cerceamento de liberdades que está em curso e que
considerou a reação à pandemia um pânico altamente exagerado
(**). Mas aquilo que esses comentaristas vêem com preocupação,
Žižek recebe com júbilo, e intitula o capítulo em que trata desse
tema justamente:
“Vigiar
e punir? Sim, por favor!”
Refere-se
Žižek, naturalmente, ao título do livro de 1975 de Michel
Foucault,
Surveiller
et Punir

no original, que descrevia a evolução das prisões do Século XIX
para as prisões sem grades da sociedade de controle da
pós-modernidade ocidental.
“Não
surpreende que, ao menos até agora, a China – que já empregava
largamente sistemas de controle social digitalizado – se tenha
demonstrado a mais bem equipada para enfrentar a epidemia
catastrófica. Deveremos talvez deduzir daí que, ao menos sob alguns
aspectos, a China represente o nosso futuro? Não nos estamos
aproximando de um estado de exceção global?”
Mas
se não é esse [o modelo chinês] o comunismo que tenho em mente,
que entendo por comunismo? Para entendê-lo, basta ler as declarações
da OMS.”
Žižek
tem uma atitude ambígua em relação à China. Admira o que
considera o êxito chinês no controle social, mas ao mesmo tempo não
parece querer identificar a sua própria concepção de comunismo com
o regime chinês, talvez porque o comunismo, ao final das contas,
exige o fim do Estado, enquanto a China representa o modelo de Estado
forte que o comunismo visa a superar. Esse não-Estado, esse grau
zero do Estado que corresponde ao grau máximo do poder, Žižek vai
buscá-lo nos organismos internacionais, que permitiriam, no que
parece ser a sua visão, o exercício totalitário sem um ente
totalizante, um ultrapoder rígido mas difuso, exercido em nome da
“solidariedade” e portanto inatacável – pois quem ousaria
posicionar-se contra a solidariedade? “Solidariedade” é mais um
conceito nobre e digno que a esquerda pretende sequestrar e
perverter, corromper por dentro, para servir aos seus propósitos
liberticidas. Já fizeram ou tentaram fazer o mesmo com os conceitos
de justiça, tolerância, direitos humanos, com o próprio conceito
de liberdade.
Não
é uma visão comunista utópica, é um comunismo imposto pelas
exigências da pura sobrevivência. Trata-se de uma variante do
‘comunismo de guerra’ como foram chamadas as providências
tomadas pela União Soviética a partir de 1918”.
Žižek
parece querer dizer: “Não se preocupem. Não há nada de
ideológico no que proponho. Apenas me guio pelo pragmatismo de quem
quer salvar a humanidade, e neste momento o pragmatismo dita a opção
por um sistema comunista, mas é um comunismo de emergência, só
isso.” Então perguntaríamos: “E quando vai acabar essa
emergência? Quando vai acabar esse estado de exceção?” Žižek
possivelmente responderia, com um sorriso cheio de “solidariedade”:
“A emergência vai durar para sempre.”
Žižek
não se preocupa com o resultado da quarentena para a contenção do
coronavírus, ele não se preocupa em conter o coronavírus, mas sim
em favorecer ao máximo o contágio do outro vírus, esse que ele
mesmo denomina o vírus ideológico, “diferente e muito mais
benéfico”. Ele louva a quarentena justamente pelo seu potencial
destrutivo. Seu mundo dos sonhos é Wuhan quarentenada:
…Uma
cidade fantasma, as lojas com a porta aberta e nenhum cliente,
somente aqui e ali uma pessoa a pé ou um carro, indivíduos com
máscaras brancas (…) fornece a imagem de um mundo não-consumista
em paz consigo mesmo.”
No
pensamento de Žižek, à custa da destruição dos empregos que
permitem a sobrevivência digna e minimamente autônoma de milhões e
milhões de pessoas, ao preço do desmantelamento de sua liberdade e
de seu sustento, se atinge um mundo “em paz consigo mesmo”. O
comunismo sempre afirmou que seu objetivo é a paz e a emancipação
de toda a humanidade. Aí, numa cidade deserta, sem emprego, sem
vida, onde cada um é prisioneiro em seu cubículo, sob a supervisão
de uma autoridade suprema que nem sequer é o governo do seu próprio
país (que por mais ditatorial que seja ainda pelo menos tem um rosto
e uma bandeira), mas uma agência global anônima e inatingível, aí
está a configuração perfeita da paz e da emancipação comunista.
Mas
o paralelo com o nazismo é talvez uma passagem ainda mais chocante
do seu livro:
‘Arbeit
Macht Frei’ é ainda o lema correto, não obstante o péssimo uso que
dele fizeram os nazistas.”
Žižek
repete aqui o lema colocado na porta do campo de concentração de
Auschwitz, a ultracínica, perversa afirmação de que “O trabalho
liberta”. Segundo ele, portanto, os nazistas não erraram na
substância, erraram apenas no uso que fizeram dessa frase. (Aqueles
que ainda não acreditam que o nazismo é simplesmente um desvio de
rota da utopia comunista, e não o seu oposto, encontrarão aqui
talvez um importante elemento de reflexão.) Segundo esse expoente do
marxismo,
Arbeit
macht frei

é o “lema correto” da nova era de solidariedade global que se
avizinha em consequência da pandemia, e o que diferencia este novo
mundo do campo de Auschwitz é que agora se fará bom uso desta
horrível mentira que perverte e humilha dois valores sagrados da
humanidade, o trabalho e a liberdade. Os comunistas não repetirão o
erro dos nazistas e desta vez farão o uso correto. Como? Talvez
convencendo as pessoas de que é pelo seu próprio bem que elas
estarão presas nesse campo de concentração, desprovidas de
dignidade e liberdade. Ocorre-me propor uma definição: o nazista é
um comunista que não se deu ao trabalho de enganar as suas vítimas.
Não
é talvez o espírito humano também uma espécie de vírus, que age
como parasita no animal humano, o utiliza para se reproduzir, e às
vezes ameaça destruí-lo? E se é verdade que o meio do espírito é
a linguagem, não seria oportuno considerar que, num plano mais
elementar, a linguagem é também alguma coisa mecânica, uma simples
questão de regras que devemos aprender e respeitar?”
Sempre
sustentei que o controle da linguagem para destruí-la enquanto meio
de pensamento, ou meio do espírito como bem diz Žižek, é um dos
grandes objetivos do comunismo, para destruir a dimensão espiritual
do homem e assim assujeitá-lo completamente. Se o espírito vive na
linguagem e se a linguagem não passa de regras a serem aprendida e
respeitadas (sim, respeitadas!), isso significa que a linguagem está,
como o comportamento social na quarentena, sujeita aos mecanismos de
“vigiar e punir”. Já era assim com as regras do politicamente
correto. Agora o politicamente correto incorpora o sanitariamente
correto, muitas vezes mais poderoso. O sanitariamente correto te
agarra, te algema e te ameaça: “Se você disser isso ou aquilo,
você coloca em risco toda a sociedade, se você pronunciar a palavra
liberdade você é um subversivo que pode levar toda a sua população
a morrer – então respeite as regras.” Controlar a linguagem para
matar o espírito, eis a essência do comunismo atual, esse comunismo
que de repente encontrou no coronavírus um tesouro de opressão.
Também
já disse e repito: o verdadeiro inimigo que o comunismo quer abater
não é o capitalismo, o inimigo do comunismo é o espírito humano,
na sua complexidade e beleza. É o espírito humano que o vírus
ideológico de Žižek chegou para destruir.
Uma
pergunta surge após a leitura desse programa totalitário cheio de
desfaçatez e hipocrisia: deve-se levar Žižek a sério?
Muito
a sério. Žižek é provavelmente o escritor marxista mais lido nos
últimos trinta anos. Influencia faculdades e círculos intelecutais
“progressistas” ao redor do mundo, que por sua vez influenciam a
mídia, que influencia os políticos, que tomam decisões muitas
vezes inconscientes da raiz ideológica dos conceitos “pragmáticos”
pelos quais se deixam guiar. O que diferencia Žižek de muitos de
seus pares é que ele enuncia abertamente o que outros escondem nas
entrelinhas.
Em
suma, Žižek explicita aquilo que vinha sendo preparado há trinta
anos, desde a queda do muro de Berlim, quando o comunismo não
desapareceu, mas apenas dotou-se de novos instrumentos: o globalismo
é o novo caminho do comunismo. O vírus aparece, de fato, como
imensa oportunidade para acelerar o projeto globalista. Este já se
vinha executando por meio do climatismo ou alarmismo climático, da
ideologia de gênero, do dogmatismo politicamente correto, do
imigracionismo, do racialismo ou reorganização da sociedade pelo
princípio da raça, do antinacionalismo, do cientificismo. São
instrumentos eficientes, mas a pandemia, colocando indivíduos e
sociedades diante do pânico da morte iminente, representa a
exponencialização de todos eles.
A
pretexto da pandemia, o novo comunismo trata de construir um mundo
sem nações, sem liberdade, sem espírito, dirigido por uma agência
central de “solidariedade” encarregada de vigiar e punir.
Um estado de exceção global permanente, transformando o mundo num
grande campo de concentração.
Diante
disso precisamos lutar pela saúde do corpo e pela saúde do espírito
humano, contra o Coronavírus mas também contra o Comunavírus, que
tenta aproveitar a oportunidade destrutiva aberta pelo primeiro, um
parasita do parasita.
(*)
Žižek, Slavoj.
Virus.
Milão, Ponte Alle Grazie, 2020 (Quinta edição digital.) (A
tradução do italiano ao português de todos os textos citados é
minha.)
(**)
Agamben, Giorgio. “Lo stato d’eccezione provocato da un’emergenza
immotivata”.
Il
Manifesto – Quotidiano Comunista,

26/02/2020.

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