Sobre a desfiliação partidária e a sua necessidade para apoiar a criação de um novo partido


Tanto o idealismo como o oportunismo podem motivar uma pessoa a se filiar a um partido político. A dinâmica de uma política viciada costuma frustrar os idealistas, aos quais restará a busca de outro partido ou a desfiliação. A filiação a outro partido já induz o cancelamento da filiação anterior, não subsistindo a coexistência de filiações. No entanto, se essa outra agremiação ainda estiver em fase de formação, o interessado deverá se desfiliar do partido anterior para poder apoiar a criação do novo partido. 


O filiado a partido político tem o direito potestativo de requerer a sua desfiliação partidária, quando haverá o cancelamento da sua filiação partidária, com a baixa nos registros desta Zona Eleitoral e a exclusão do seu nome do quadro de filiados do partido a partir da data da comunicação ao diretório municipal do partido ou ao juiz da respectiva zona eleitoral.


Com a sua legítima supremacia constitucional hierárquico-normativa, o art. 5º, XX, da CF/88, consigna o direito natural da pessoa humana de associar-se e desassociar-se, afirmando que “ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado”. Bastaria esse dispositivo constitucional para legitimar a automática desfiliação partidária do filiado interessado em desconstituir o vínculo jurídico entre o filiado e a agremiação, por se tratar de direito potestativo de imediato efeito, sujeito tão somente à homologação com efeito retroativo (ex tunc) à data da manifestação da vontade do filiado.



Por uma questão de unidade, lógica e racionalidade do sistema hierárquico normativo, qualquer previsão infraconstitucional só pode ter interpretação conforme a Constituição. Desse modo, o art. 21, da Lei nº. 9.096, somente pode ser interpretado como faculdade do filiado em comunicar o órgão de direção municipal do partido ou ao juiz eleitoral. Não há previsão de forma específica para o filiado requerer a sua desfiliação, sendo possível o envio de e-mail para o endereço eletrônico do diretório municipal. 



É comum o partido político não efetuar a baixa da filiação por diversos motivos, como por mera desorganização ou até mesmo por intenção de prejudicar eventual apoiamento mínimo à criação de outro partido e fulminar a concorrência nas eleições seguintes. Afinal, como se sabe, para assinar lista de apoio à criação de um novo partido, é necessária a desvinculação de qualquer outro.



Pode ocorrer ainda que o interessado acredite estar filiado, sem que o partido sequer tenha formalizado a sua filiação. A priori, o interessado poderia simplesmente apoiar a criação de outro partido, por inexistir filiação formalizada. No entanto, é possível que a agremiação anterior intente prejudicar o apoiamento à criação de outro partido e venha a fazê-lo somente a posteriori. Para evitar casos assim, ainda que o partido não tenha formalizado a filiação, o interessado cauteloso poderá informar ao juiz eleitoral previamente a inexistência de vínculo com aquele partido anterior, o que pode ser feito pessoalmente ou através de advogado.



A jurisprudência ainda não consolidou o entendimento elementar da faculdade do filiado informar ao diretório municipal ou ao juiz eleitoral, havendo apenas a previsão específica do art. 13, §5º, da Resolução TSE nº. 23.117, que exige apenas a comunicação ao juiz da zona eleitoral de inscrição do filiado, quando o diretório municipal do partido político não puder ser localizado. 



Dentre as hipóteses de cancelamento de filiação partidária não se inclui a de transferência de domicílio eleitoral (art. 21, da Resolução TSE nº. 23.569, de 20/08/2019), vez que o partido tem caráter nacional (art. 5º, da Lei nº. 9.096). 



Enfim, o filiado interessado deve apresentar comunicação de desfiliação partidária ao diretório municipal e ao juiz eleitoral, requerendo o cancelamento da sua filiação partidária, com a baixa nos registros da Zona Eleitoral e a exclusão do seu nome do quadro de filiados do partido. O pedido tem natureza administrativa, pode ser praticado pessoalmente ou através de advogado e não se submete a taxas judiciárias (art. 2º, XI, da Lei nº. 9.784).

Salvador, 08 de janeiro de 2020.

Ricardo Maurício Nogueira e Silva
Advogado. E-mail: ricardonogueira85@gmail.com
Especialista em direito público pela Faculdade de Direito Universidade Federal da Bahia
Membro do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia

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